A Justiça testemunha há dois anos uma briga da família do ex-governador Marcelo Miranda Soares, de 86 anos, para administrar o patrimônio do político, que tem saúde fragilidade pela idade, problema renal e foi interditado.
Engenheiro, Miranda veio de Minas Gerais para o então Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul, para trabalhar na construção da usina hidrelétrica de Jupiá, em Três Lagoas. Miranda ocupou postos de proa no tabuleiro político. Foi prefeito de Campo Grande, governador nomeado de MS (1979), governador eleito (1986) e senador. Em 2012, acabou demitido do cargo de superintendente do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte).
A batalha pelo patrimônio do ex-governador começou em janeiro de 2023, quando os irmãos Paulo Eduardo e Paulo Henrique Cançado Soares, filhos de Miranda, entraram com processo na 6ª Vara de Família e Sucessões de Campo Grande para interdição do pai. A justificativa foi a saúde, que o impedia de exercer com plenitude suas atividades, como as movimentações financeiras.
Paulo Eduardo informou ter sido nomeado procurador pelo pai em 1995. A liminar foi deferida e ele passou a ser o curador de Marcelo Miranda. Contudo, logo em seguida, em março de 2023, Maria Antonina Cançado Soares, 84 anos, esposa do ex-governador entrou com pedido para que ela fosse a curadora, apesar de o filho apontar que a sua condição de saúde também não permitiria cuidar do patrimônio.
Eles são casados há 62 anos e em regime de comunhão universal de bens. De acordo com o pedido, o Código Civil determina que “cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é, de direito, curador do outro, quando interditado”. O juiz determinou a curatela compartilhada entre Maria Antonina e Paulo Eduardo.
Mas, em novo pedido à Justiça, a mãe relatou que havia fatos que poderiam até justificar uma “deserdação”. O fato mais grave foi registrado em fevereiro de 2023. Segundo o cuidador de Marcelo Miranda, Paulo Henrique esteve na residência do casal para obter a assinatura do pai em documento que os demais desconheciam o conteúdo.
Maria Antonina também questionou a gestão dos negócios. “Tendo em vista ter recebido do arrendatário da Fazenda Pitomba documento comprovando a apropriação, por Paulo Eduardo, de mais de 7 milhões de reais de verbas do arrendamento da referida fazenda, que deveriam ter sido repassados para a arrendante Agropecuária Lopes Cançado Ltda”. A fazenda fica no Mato Grosso.
No fim de 2023, mais uma irmã entra no processo. Ana Cristina Cançado Soares afirmou que mora com os pais há 14 anos e é responsável, junto com a mãe, pela administração da casa e de oito funcionários. Em junho de 2014, a Justiça nomeou Maria Antonina e Ana Cristina como curadoras, considerando que estão mais próximas a Marcelo Miranda.
Os irmãos homens recorreram ao TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul). Relator do caso, o desembargador Luiz Tadeu Barbosa Silva se mostrou sensível a situação e lembrou que era melhor que as famílias se mantivessem unidas.
“No que toca às questões atinentes à curatela, infelizmente é evidente a existência de desavenças familiares expressas, inclusive por meio de denúncias de ambos os lados, o que inviabiliza a nomeação conjunta dos filhos e a cônjuge do curatelado. Em outras palavras: bem melhor seria que, em prestígio ao bem estar familiar, os filhos e a cônjuge se unissem buscando a melhor solução para o caso. Todavia, a animosidade existente, especialmente no que se refere à administração dos bens e rendimentos do interditando, inviabiliza a conjugação de esforços nesse sentido”.
“Assim, embora cada parte possua incontestáveis aptidões específicas que atendam à gestão patrimonial envolvida, como já afirmado, o que se busca é atendimento dos melhores interesses do interditando, e nesse aspecto, a sentença deve ser mantida”.
O voto do relator foi acompanhado pelos desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça. O julgamento aconteceu no dia 25 de fevereiro deste ano.