Claudinei Tolentino Marques é um dos presos na Operação Prime, da Polícia Federal
Preso há 32 dias, o empresário douradense Claudinei Tolentino Marques, 42, ganhou 13 prêmios da Quina, uma das loterias da Caixa Econômica Federal, no período entre 28 de junho de 2019 e 2 de julho de 2019, com montante de R$ 286 mil.
A informação faz parte das investigações da Polícia Federal no âmbito da Operação Prime, que no dia 15 de maio deste ano prendeu vários empresários de Dourados acusados de ligação com o tráfico de drogas.
De acordo com a PF, Claudinei é suspeito de fazer lavagem de dinheiro para os irmãos Marcel Martins Silva, 35, e Valter Ulisses Martins Silva, 27, apontados como chefes da organização criminosa responsável pela remessa de grandes carregamentos de cocaína da fronteira com o Paraguai para grandes centros brasileiros.
O fornecedor da droga, ainda de acordo com a investigação, seria um dos principais traficantes da linha internacional na atualidade: Antonio Joaquim Mendes Gonçalves da Mota, conhecido como “Motinha” e “Dom”. Ele está foragido.
Relatório da PF que embasou os pedidos de prisão e de busca e apreensão da Operação Prime afirma que as três empresas de Claudinei – GR Construtora e Incorporadora, CCRG Construtora e Federal Armas – foram usadas para lavagem de dinheiro oriundo do comércio de drogas.
As operações eram “maquiadas” através da venda de veículos de luxo, entre eles uma BMW 320i M Sport, uma Toyota Hilux SW4 e uma caminhonete RAM.
O dinheiro entrava nas contas das empresas de Claudinei através de depósitos em espécie e também por meio do doleiro Hector Rodrigo Salinas Esquível, que opera na linha internacional entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero a serviço dos irmãos Marcel e Valter Martins.
“Há elementos nos autos que indicam que Claudinei auxilia os irmãos Valter e Marcel no mascaramento patrimonial, supostamente cedendo as contas de pessoa jurídica para recebimento de valores. Um print de Whatsapp demonstra que Valter teria solicitado a Hector o pagamento de R$ 100 mil em favor da empresa GR Construtora e Incorporadora, localizada na cidade de Dourados/MS, cujo responsável é Claudinei Tolentino Marques, que deveria ser registrado sob a referência ‘entrada SW4-Diamond’”, afirma a PF.
A investigação revelou que a Hilux SW4 vendida por Claudinei foi registrada em nome da empresa Paris Construtora e Transportadora, pertencente a Evelyn Zobiole Marinelli Martins, esposa de Marcel Martins e também presa na operação.
Atualmente, a SUV de luxo está registrada em nome da Efraim Incorporadora e Construtora, uma das empresas de Marcel Martins em Dourados.
“Verifica-se, portanto, que os irmãos Martins utilizam recursos obtidos do tráfico de drogas, gerenciados pelo doleiro Hector, para o pagamento de bens móveis que são posteriormente integrados ao patrimônio das empresas da família”, afirma PF.
Ainda de acordo com a investigação, os irmãos Martins mantêm com Claudinei Tolentino esquema de ocultação da origem dos valores utilizados na aquisição de seus veículos. “Aparentemente, os veículos são comprados em nome da construtora de Claudinei, que posteriormente os transfere para os irmãos Martins”.
Para driblar os órgãos de fiscalização, o dinheiro era enviado pelo doleiro da fronteira para as contas das empresas de Claudinei, para ocultar a origem do dinheiro.
Casa de câmbio
“O dinheiro obtido com o tráfico de drogas passa num primeiro momento por contas controladas pela casa de câmbio, daí é enviado a uma das construtoras de Claudinei, que utiliza outra construtora para aquisição do veículo e emissão da nota fiscal, e, por fim, é transferido ao patrimônio dos irmãos Martins”, detalha a PF.
Os prêmios da Quina obtidos por Claudinei e a grande movimentação envolvendo veículos chamaram a atenção do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
“A primeira comunicação de operação suspeita remetida pelo Coaf e que é publicamente associada à lavagem de capitais se refere à excessiva premiação em loterias existente em nome de Claudinei. Outro conjunto de comunicações refere-se justamente à aquisição e revenda de veículos de forma suspeita”, afirma a Polícia Federal.
Aparentemente, Claudinei Tolentino Marques passou a reconhecer em cartório a sua assinatura em tantos documentos de revenda de veículos que tal situação foi ser comunicada ao Coaf pelos cartórios.
“A quantidade de comunicações e, por conseguinte, de veículos revendidos por Claudinei não se justifica, justamente em razão das atividades que, em tese, desempenha”. As empresas dele não têm o comércio de veículos entre suas atividades registradas.
Também chamou a atenção do órgão de controle o grande número de apólices de seguro compradas pelo empresário. Foram 12 de dezembro de 2020 a fevereiro de 2023.
Depósitos em espécie
O Coaf foi informado ainda sobre os altos valores de dinheiro em espécie depositados nas contas vinculadas a Claudinei e suas empresas em agências bancárias de Dourados.
Entre os valores depositados estão R$ 3,7 milhões com justificativa de “pagamento de dívidas”, R$ 2 milhões para “pagamento de acordo judicial” e R$ 4,6 milhões para “pagamento de empreendimento”.
“O conjunto de empresas administradas por Claudinei Tolentino – Referência Construtora E Incorporadora, GR Construtora e Incorporadora, CCRG Comércio Varejista de Materiais de Construção, Ervais Construtora e Incorporadora e Wondergul God Administradora De Bens – fazem parte de uma macroestrutura de lavagem de capitais”, cita a PF.
Fuzis e pistolas
Outra ligação de Claudinei e os irmãos Martins envolve a empresa Federal Armas, alvo de operação do Dracco (Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado), da Polícia Civil de MS, em julho do ano passado.
Segundo a PF, a Federal Armas vendeu duas pistolas e dos fuzis para Valter Martins usando documentos falsos para legalizar a transação, entre os quais um holerite falsificado, para comprovar trabalho lícito.
Valter também teria pedido ajuda a Claudinei para incluir como CAC (Caçador, Atirador e Colecionador) um morador de Campo Grande com antecedentes por uso de documento falso e tráfico de drogas.
A PF rastreou pelo menos cinco pagamentos feitos pela organização dos irmãos Maciel para a Federal Armas, com valores de R$ 30 mil a R$ 65 mil. Oficialmente, Claudinei deixou a empresa Federal Armas em 28 de março de 2023. Atualmente, sua esposa figura como única proprietária.
Irmão preso
O irmão de Claudinei, Luiz Antonio Tolentino Marques, 47, também foi preso no âmbito da Operação Prime. Dono de loja de veículos em Santa Fé do Sul (SP), Luiz Antonio passou de trabalhador com carteira assinada para milionário, que movimentou pelo menos R$ 85 milhões entre 2020 e 2023, dos quais R$ 45 milhões apenas em suas contas pessoais.
A Polícia Federal identificou que Luiz Antonio utilizava “laranjas” com baixa capacidade econômica e parentes – filho, esposa e dois cunhados – para movimentação de valores em conta, para registro de bens e para integrar quadro societário de empresa. Quantias milionárias também foram movimentadas entre Luiz Antonio e Claudinei.
“A prisão preventiva foi decretada sob a justificativa da garantia da ordem, uma vez que são fortes os indícios do envolvimento do investigado em organização criminosa ainda em pleno funcionamento; da conveniência da instrução criminal, para o fim de evitar a destruição das provas da prática dos crimes; e assegurar a aplicação da lei penal, pelo risco concreto de fuga”, citou o desembargador Ali Mazloum, do TRF (Tribunal Regional da 3ª Região) ao negar liberdade ao empresário, em maio.
A defesa de Luiz Antonio informou que trata-se de investigação em tese sobre crime de lavagem de dinheiro, “dependente ainda de averiguação de recursos com e sem origem, ainda não realizada nem indicada por qualquer órgão investigador”.
Segundo o advogado Jail Benites de Azambuja, a investigação contra os irmãos Tolentino não é sobre tráfico e apenas de lavagem de dinheiro, até o momento. Luiz Antonio foi preso em Barra do Garças (MT), onde possui fazenda.
Outro lado
Ao Campo Grande News, o advogado de Claudinei, Luiz Gustavo Bataglin Maciel informou que as suas transações bancárias são todas decorrentes de negócios lícitos, baseados em contratos formais, “de modo que ao longo do processo as suspeitas serão todas devidamente esclarecidas”.
Quanto aos prêmios de loteria, “que, aliás não são de alto valor”, segundo ele, trata-se de “bolão” do qual várias pessoas de Dourados participaram e receberam cada qual os valores correspondentes às suas cotas, inclusive autoridades, “que eventualmente poderão também ratificar tal fato se for necessário”.
Sobre transações entre os irmãos Tolentino tratadas como suspeitas, a defesa esclarece que aparentemente motivo de terem sido reputadas atípicas (ou suspeitas) é apenas o valor expressivo de algumas transações. “Contudo, todas estão alicerçadas em negócios lícitos, e além disso, constam das declarações de Imposto de Renda de ambos”.
Segundo o advogado, as vendas dos dois veículos que acabaram colocando Claudinei na investigação também possuem contratos formalizados e poderiam ter sido esclarecidas caso ele fosse intimado para ser ouvido e fornecer documentos, “mas isso infelizmente não aconteceu”.
Sobre a venda de armas, Bataglin informou que a empresa vendeu produtos legalmente para um dos investigados, com a documentação fornecida sendo enviada para o Ministério do Exército, o qual autorizou a negociação e emitiu o Certificado de Registro de Arma de Fogo.
“A empresa não tem responsabilidade por eventual falsidade dos documentos apresentados, até porque quem faz essa análise é o Ministério do Exército, quando autoriza a venda e o registro da arma. Nenhuma arma foi comercializada sem autorização do Ministério do Exército ou da Polícia Federal enquanto a empresa Federal Armas esteve sob comando de Claudinei Tolentino Marques”.