Tucura Segatto (PTB) foi gravado propondo à -assessora que ela dividisse salário com colega
Polêmica no município de Rio Brilhante mostra mais uma vez a diferença entre discurso e a prática na política. Eleito prometendo ser a “cura” contra corrupção, o vereador Tucura Segatto (PTB) foi gravado propondo a uma ex-assessora que ela dividisse o salário pago pelo Legislativo com um colega para ajudá-la, sem que este fosse contratado oficialmente, a chamada “rachadinha”. O caso gerou indignação na Câmara e o parlamentar corre risco de perder o mandato.
O áudio começou a circular nas redes sociais entre moradores da cidade e mostra três pessoas conversando, o vereador, a ex-assessora e outro assessor, sobre a divisão de como seria feito o trabalho de assessoria, com postagens nas redes sociais e de acompanhamento do parlamentar, um no período da manhã e o outro, à tarde.
Em determinado momento, Tucura, que é defensor dos ideais do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), diz: “É você que vai pagar ele, tá?”, propondo a contratação da mulher para ser remunerada como servidora da Câmara, enquanto um colega a ajudaria, mas ambos teriam que dividir o salário pago para ela.
Os funcionários continuam discutindo a divisão do trabalho, e a ex-assessora questiona quanto o rapaz iria receber de pagamento pelo vereador, e o colega informa que receberia dela. “Não pode, é peculato”, diz ela, fazendo em seguida referência a um homem chamado Juarez, que teria autorizado a situação. “Isso aí é você que vai pagar, não é o Juarez nem ninguém”, intervém Tucura.
A ex-assessora volta a dizer que a divisão do mesmo salário, a “rachadinha”, é peculato, desvio de dinheiro público. “Você vai pagar alguém que vai fazer parte do seu serviço”, rebate o vereador. “Mas é o meu salário”, afirma ela.
A mulher demonstra preocupação com o caso, e quer garantias de que não vai lhe causar problemas no futuro. “E se mais tarde der um rolo? Eu não vou me ferrar sozinha não”. O vereador Tucura diz que só daria problema se ela contasse a alguém.
“Eu se eu for fazer, só que eu quero em espécie”, diz o outro assessor. “Se acontecer alguma coisa, é nós três que toma fogo. Para alguém saber disso aí, é só se algum de nós três der com a língua nos dentes”, completa. Para se precaver, a mulher exige recibo para efetuar o pagamento.
Em um dos áudios, Tucura conversa com alguém ao telefone, tentando esclarecer se haveria problema em os assessores racharem o salário. “Como a pessoa da parte da manhã que recebe, essa pessoa ficou com o compromisso de pagar o da tarde. A pessoa que tá nomeada recebe, mas ela acerta com o outro. Assim que a gente combinou”, explica o vereador.
Com conhecimento dos áudios, outros vereadores comentaram o caso durante sessão na Câmara de Rio Brilhante, que possui 13 vereadores. Rodrigo Laboisier (PSDB) afirmou que vai fazer denúncia ao Ministério Público de Mato Grosso do Sul. E alertou os colegas de que um processo de cassação tem que ser aberto para apurar o caso.
“Rachadinha é crime, gente, da onde que vocês falam que não estão sabendo. Quando o Ministério Público bater aqui, eu quero ver quem vai votar contra [cassação]. Quero olhar para cada um de vocês e ver quem vai votar contra. Alguém vai ter coragem de votar a favor do crime?”, discursou Laboisier, na tribuna da Casa.
O vereador Éverton Cristiano (União) disse à reportagem de O Jacaré que foram feitas denúncias à Polícia Civil sobre a proposta de rachadinha e que devem ir ao Ministério Público.
“Nós vereadores temos que averiguar, porque existe material concreto, que são os áudios. Estamos trabalhando e provavelmente abriremos uma comissão de inquérito para averiguar a veracidade e ouvir os envolvidos. Vamos ver o rito que o nosso jurídico vai determinar para a gente seguir aqui”, explicou Cristiano.
O presidente da Casa, vereador Paulo César Alves (MDB), diz que para abrir processo de cassação tem que haver um pedido protocolado na Câmara Municipal, o que pode ser feito por qualquer pessoa moradora da cidade, o que ainda não ocorreu.
“Por enquanto ninguém protocolou nada, se porventura alguém protocolar, aí vai para sessão para ser votado se os vereadores acatam a denúncia ou não. Acatando a denúncia, se tiver, aí tem que sortear uma comissão para avaliar e investigar o fato”, relatou Paulo César. Ele diz que não ouviu os áudios.
Perseguido pelo sistema
O vereador Tucura Segatto confirmou à reportagem de O Jacaré que é sua voz nas gravações e disse que é “perseguido pelo sistema”, que tenta prejudicá-lo por seu discurso de diminuir gastos públicos e cortar benefícios dos próprios vereadores. Ele afirma que apresentou um projeto de lei que põe fim ao recebimento de 13º e férias pelos parlamentares do município.
Tucura também registrou boletim de ocorrência por calúnia e difamação, na quinta-feira (2), contra a ex-assessora na Delegacia de Polícia de Rio Brilhante. Ela teria gravado a conversa e divulgado os áudios. De acordo com o vereador, foi a mulher que sugeriu rachar o salário com o colega.
“Não tenho dúvida nenhuma de que sou vítima de perseguição, me acusando de rachadinha que nunca existiu. Ela deu a ideia de ficar de manhã e, não podendo me acompanhar à tarde, ela traria alguém para ficar no lugar dela. A proposta partiu dela. Não cometi crime nenhum”, relatou Tucura.
“Eu tinha gratidão pelos dois, não queria deixar nenhum para trás. Nenhum dos dois queria me atender com minha necessidade de um vereador que trabalha na parte da tarde também, que aqui ninguém faz isso. Então eu falei ‘vocês têm que achar um jeito’. Aconteceu conversas com essa mulher gravando, mas como a gente não é criminoso e só tinha o objetivo de fazer um grande trabalho, com o menor custo possível para não onerar o bolso do cidadão. O sistema não aceita pessoas que queiram realmente fazer a diferença”, concluiu.