Mais uma vez, a direção da PED (Penitenciária Estadual de Dourados), maior presídio de Mato Grosso do Sul, está sendo acusada de permitir regalias a presos endinheirados. Denúncia de servidores, que chegou ao Campo Grande News, revela que a proteção aos chamados “presos de estimação” compromete até mesmo a autoridade dos policiais penais e coloca em risco a segurança da penitenciária e a disciplina prisional na unidade penal.
Entre esses presos “protegidos” está o narcotraficante Aldo José Marques de Souza, o “Sheik”. Um dos bandidos mais famosos de Mato Grosso do Sul, ele cumpre 40 anos de prisão por tráfico internacional de drogas, tem pena a cumprir até 2037 e previsão de progressão para o regime semiaberto apenas em junho de 2029.
Em janeiro de 2021, o narcotraficante recebeu atestado da Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) para ser transferido para a unidade de Ponta Porã, mas a manobra foi barrada pela Justiça.
“Apadrinhados”
Conforme a atual denúncia, também levada à Ouvidoria do Governo de Mato Grosso do Sul, presos com suposto apadrinhamento de diretores são mantidos na ala conhecida como “Capela”, setor que não possui grades e fica o tempo todo aberto, segundo afirmam servidores do sistema penitenciário ouvidos pela reportagem.
Nesse setor, ainda segundo as denúncias, os “presos de estimação” têm horário diferenciado de banho de sol, contam com chuveiro elétrico e aparelhos de musculação. Temendo retaliação funcional, os agentes estariam deixando de fazer revistas na “Capela”.
“Entre esses presos de estimação está narcotraficante Aldo José Marques Brandão, que possui inúmeras regalias, não estendidas ao restante da massa carcerária”, afirma a denúncia.
Indisciplina
Em 23 de fevereiro deste ano, Aldo Brandão teria praticado ato de indisciplina contra policiais penais, se sentindo protegido pela chefia do presídio.
A reportagem teve acesso ao documento enviado pelo chefe de Disciplina da PED ao chefe da equipe de plantão do dia, relatando a conduta de Aldo Brandão, que descumpriu ordem dos policiais penais e entrou em área onde, naquele momento, nenhum preso poderia ficar. O narcotraficante presta serviços dentro do presídio e possui crachá de “preso trabalhador”.
“Por volta das 16h20, quando da realização de exaustivo confere, com aproximadamente 100 mudanças de celas por força das necessárias adequações dos internos estudantes, chegou na gaiola de segurança dos raios II e III o sentenciado Aldo José Marques Brandão e foi lhe solicitado que aguardasse fora da gaiola. Por sua vez, o interno adentrou sem qualquer autorização a este setor quando havia diversos policiais penais em missão de confere dentro do pavilhão”, afirma o documento.
A “gaiola” é área de segurança localizada entre os pavilhões II e III. Durante o chamado “confere” feito pelos agentes, nenhum preso pode ficar nesse espaço.
Segundo o ofício, Aldo Brandão foi advertido de que deveria ficar do lado de fora da “gaiola” durante o procedimento nas celas, mas ele teria feito “pouco caso” dos policiais penais.
“A reação dele foi antagônica a tudo o que se deve esperar de interno que está em exercício de atividades laborais dentro de uma penitenciária. Imediatamente, ele contestou de forma veemente a ordem proferida pela autoridade policial, na frente de outros internos que também aguardavam ordem para realizar as suas funções”.
Ao perceber a situação, outro policial penal se aproximou e também deu ordem para que Aldo Brandão saísse do local, mais uma vez ignorada pelo preso. “Mais do que ato flagrante de indisciplina, configura-se ato de rebeldia frente a outros internos e demonstra que este interno desprestigia o trabalho policial, devendo ser revista a sua situação de prestar serviços laborativos dentro desta casa”, afirma a denúncia.
Após reiteradas recusas do preso em sair da “gaiola”, os agentes recolheram o crachá de trabalho de Aldo Brandão e o levaram para o “isolamento preventivo”. Após o ocorrido, segundo a denúncia, o chefe de equipe foi transferido para outro plantão, “contra sua vontade”.
A falta administrativa do preso foi registrada no sistema, mas nenhum processo administrativo (chamado de Padic) teria sido instaurado para apurar o caso.
Além do narcotraficante, a denúncia revela que outro interno, conhecido como “Voz” do raio IV (cadeia da saúde), também conta com regalias pelo fato de seu pai ser amigo pessoal de membro da direção do presídio.
Outro lado
A Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) informou que está apurando as circunstâncias referentes à ocorrência citada no comunicado, inclusive com as imagens em posse da Corregedoria-Geral. “As demais situações apontadas também serão apuradas”, segundo a agência.
Sobre a suposta falta de instalação de processo disciplinar sobre o comportamento de Aldo Brandão, a Agepen informou que os trâmites começaram em março e o “procedimento apuratório” aberto em 30 de junho.
Crédito: Campo Grande News