Relatório do Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado), que denuncia delegados e investigadores de polícia atuantes na fronteira entre Bolívia e Corumbá, cidade a 419 km de Campo Grande, revela um esquema peculiar entre os gestores das delegacias para obter lucros com o tráfico de drogas. Segundo o Ministério Público, eles tinham até rixa pelo apoio aos traficantes.
O relatório traz detalhes do que seria um esquema de tráfico de drogas em Corumbá e Ladário, entre os anos de 2018 e 2019, sob o comando dos delegados: Fernando Araújo da Cruz Júnior, de 38 anos, e Rodrigo Blonkowski, 34. Estes, que já respondem a outros processos, sendo Fernando condenado por homicídio doloso duplamente qualificado, coação e fraude processual, pelo assassinato do boliviano Alfredo Rengel. Já Rodrigo foi preso por posse de munições irregulares, no ano de 2022.
Ainda de acordo com o relatório, ambos os gestores contavam com a ajuda dos investigadores e "braços direito": Emmanuel Nicolas Contis Leite, 34, e Amando Yoshitaka Balancieri, 39. Estes, por sua vez, contatavam traficantes para ajudar no esquema, sendo Eduardo Alencar Batista, o "Dudu", de 39 anos, Daniel Pereira Sampaio, conhecido como "Zé Gotinha", de 37, Luiz Adriano London Martins, o "L15" ou "Aplicativo", 35, e Valcir Ricardo Galharte ou "Mingucho", de 50 anos.
Esquema - A investigação de peculato, tráfico de drogas e extorsão apontou que os delegados e investigadores se "validavam das funções para identificar e abordar traficantes de drogas, afim de se apropriarem de valores, armas de fogo, entorpecentes e outros bens que estivessem em poder dos alvos das diligências (...)", aponta o relatório.
Produtos apreendidos, como drogas e dinheiro, não eram arrolados em boletins de ocorrência e, posteriormente, eram desviados pelos policiais para a casa dos comparsas. Depois, as drogas eram redistribuídas a outros traficantes. Assim, segundo o Ministério Público, delegados e investigadores ficavam com o "lucro".
Mas, para isso, estariam contando com o apoio de traficantes da cidade. Inclusive, o relatório da polícia aponta uma rixa entre dois grupos liderados pelos delegados, o que deu até nome para a investigação da Corregedoria da Polícia Civil, de "Operação Concorrência". O primeiro grupo formado pelo delegado Rodrigo, o investigador Amando e "Dudu".
A respeito da rivalidade havida entre os dois grupos, e sobretudo sobre o conhecimento que cada um possuía acerca das atividades delituosas do outro, registra-se que, na data de 14 de janeiro de 2019, Rodrigo Blonkowski, durante diálogo havido com Amando Yoshitaka Balancieri, mencionou sobre a atuação do grupo concorrente". Na ocasião afirmou, em referência a Fernando: 'gosta de deixar os peões dele roubar'".
Os envolvidos pagavam até bonificação a traficantes que fornecessem informações relevantes sobre outros traficantes. Esse contato era feito direto por Amando. As investigações mostram que para não serem descobertos, conversavam por códigos ao telefone, como uma interceptação revela conversa no dia 11 de dezembro de 2018 entre Amando e a esposa. "Não fala nada aqui [telefone], que vai para o zap".
Amando contava com a ajuda de Dudu, que era o responsável por monitorar as rodovias para que as equipes policiais conseguissem abordar os suspeitos e, posteriormente, apreender drogas.